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Pedro Cordeiro: «A Federação está a fazer concorrência desleal aos treinadores»
Encontrámos Pedro Cordeiro no Centro de Treino de Monsanto, por ocasião do Lisboa Challenger em padel. Um encontro que desde logo levantou algumas questões. Estaria o ex-selecionador e capitão da Taça Davis e Fed Cup no evento como mero espetador ou teria algo mais a contar? Desafiado para uma conversa descontraída com o Bola Amarela, Pedro Cordeiro não só não hesitou como revelou estar a fazer “uma pausa no ténis” e ter assumido os seus novos desafios… no padel. Porquê? O antigo treinador explica, sem conseguir, contudo, esconder alguma mágoa no olhar, ao mesmo tempo que partilha algumas considerações sobre a atualidade do ténis em Portugal e o trabalho da Federação Portuguesa de Ténis (FPT), nomeadamente na área da competição.
Este novo desafio na empresa de equipamentos desportivos Aysa, mais concretamente na área comercial, não significa, de certa forma, um afastamento do ténis?
Resolvi fazer, reconheço, uma pausa no ténis durante algum tempo. Se daqui a um ano, por exemplo, achar que este não é o meu caminho, pego na minha raqueta e volto para o court sem qualquer problema.
Essa pausa deve-se a quê? Cansaço?
Cansaço e alguma desilusão como as coisas se foram desenrolando.
Em relação a….
Julgo que, no fundo, alguns jogadores não dão valor aos treinadores, com quem não existe uma relação estável. De uma forma geral, andam um pouco perdidos. Os resultados não se alcançam de um dia para outro e depois, quando corre bem, não dão continuidade. É algo que me ultrapassa.
Nota-se alguma mágoa quando fala deste tema em particular.
Estou um bocado magoado, no sentido de… O meu pai educou-me para fazer as coisas por gosto e não para ser reconhecido, mas depois vejo coisas que tenho alguma dificuldade em entender. Esta direção da FPT, liderada por Vasco Costa, oferece aos jogadores da alta competição a possibilidade de poderem usar os treinadores do Centro de Alto Rendimento (CAR), sem custos, para as deslocações aos torneios. No caso do João Sousa essa questão não se coloca porque ele tem o seu treinador, mas os outros atletas vão jogar dois, três ou quatro torneios na Europa e solicitam à FPT o acompanhamento de um técnico do CAR. E a única despesa a ser paga pelo jogador são as deslocações e estadia, mas não tem os encargos dos honorários a um treinador.
E isso, depreendo, reduz o mercado de trabalho aos treinadores que não estão afetos ao CAR.
Tira mercado, naturalmente. Percebo que para jogadores sem patrocínios, e num contexto complicado, é uma grande ajuda porque, feitas as contas ao final de um ano, é algum dinheiro. Mas por outro lado, a FPT está a fazer uma concorrência desleal aos treinadores, no meu entender, porque não dá liberdade de escolha.
Que liberdade de escolha?
Já que está com dinheiro, e atendendo a não ser essa a vertente de um CAR, a FPT devia estipular uma verba/ajuda de custo diária ao jogador e o próprio ser livre de escolher o treinador com quem trabalhar. Assim, o mesmo atleta já não seria obrigado a escolher por uma questão financeira, mas por uma questão de qualidade. Note-se que não estou a dizer que os treinadores do CAR não têm qualidade, muito pelo contrário. A questão não é essa. Mas, para mim, é um sistema à priori viciado. Outra questão é: será correto um CAR prestar esse tipo de serviço? Tenho outra ideia de um CAR de uma Federação e decididamente não passa por esse tipo de serviço.
Passa por quê, na sua opinião?
Não devíamos ter atletas a partir de determinada idade a serem apoiados como continuam a ser. A grande maioria dos jogadores que estão no CAR são seniores. Não vejo isso acontecer em muitos países. O CAR devia apoiar e trabalhar com atletas mais jovens e alguns seniores, mas na faixa de transição de júnior para sénior, em que passam por dois ou três anos complicados. Não digo que os mais velhos não possam lá treinar, mas o apoio não devia ser feito nestes moldes. Não vejo a FPT a apostar em estruturar o ténis, aumentar a base para ter mais jogadores no topo. Podiam aumentar, por exemplo, o leque de torneios internacionais aos jogadores mais jovens e, com a ajuda dos pais, fazer um programa muito mais completo e com a garantia de maior duração no tempo.
“Parece-me existir um excesso de gastos, sem necessidade, a nível de Taça Davis e eventualmente da Fed Cup. Era preciso haver efetivamente algumas mudanças e melhorias, que até já estavam previstas, e acabou por acontecer com dinheiro caído do céu”
Cessou o seu vínculo à FPT em 2013. Desde então, como tem acompanhado o trabalho desta direção, de um modo geral?
Não estou muito por dentro porque deixei de ter contacto. Mas parece-me existir um excesso de gastos, sem necessidade, a nível de Taça Davis e eventualmente da Fed Cup. Era preciso haver efetivamente algumas mudanças e melhorias, que até já estavam previstas, e acabou por acontecer com dinheiro caído do céu. Ninguém fez nada para conseguir este dinheiro, não houve um trabalho de fundo para angariar patrocinadores ou novos apoios. O dinheiro que há é do jogo e, na minha perspetiva, é preciso ter atenção. Hoje há um decreto de lei a determinar uma determinada verba para cada Federação, mas isso pode acabar e esse dinheiro pode deixar de aparecer. Penso que deveria ser feito um trabalho mais rigoroso no sentido de angariar parceiros e patrocínios por outra via e de forma sustentada para que, no futuro, o trabalho e os resultados tenham continuidade. Neste momento recebemos muito dinheiro mas, até esse, poderia ser melhor empregue, apostando nomeadamente nas camadas jovens, fazendo mais estágios para os melhores atletas treinarem mais vezes juntos, atribuindo uma percentagem às Associações e obrigando-as assim a maiores responsabilidades e a integrarem o processo. A FPT continua a dar às Associações o valor correspondente às Licenças, mas não há uma discussão generalizada para se fazer um programa a nível global, desporto escolar, captação de jovens, etc. Cada vez há mais modalidades e menos jogadores de ténis! E por alguma razão é. Não me parece ser uma boa decisão investir só na Taça Davis, Fed Cup e nos torneios. Não vai funcionar porque, se os torneios não tiverem bons jogadores, deixam de fazer sentido. Depois deste atual leque de jogadores, justifica-se gastar o dinheiro nos torneios? Justifica-se gastar o dinheiro nas equipas da Taça Davis?
Depois desta geração de João Sousa, Gastão Elias, Pedro Sousa & Ca, quem se segue?
Essa é a questão. Não vejo grandes seguidores, até porque vários estão a optar pelo desporto universitário nos EUA. O João Monteiro é/foi exemplo disso, embora tenha voltado a Portugal porque foi convidado para trabalhar na sua área de formação académica. Acabou por se dedicar ao ténis, mas não são muitos os casos. O Duarte Vale, por exemplo, está no desporto universitário, mas não estou a ver muitos mais jovens na calha para suceder a esta geração.
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