OPINIÃO. O que aconteceu no Mónaco, Madrid e Roma aconteceu. Agora estamos em Paris. E então?
Estávamos no ano de 2019. Uma pandemia que parasse o mundo estava longe dos nossos maiores pesadelos e o ténis caminhava de forma natural, como sempre, para mais uma edição de Roland Garros. Rafael Nadal ‘só’ tinha 11 títulos conquistados em Paris e era esse o ano em que parecia estar a dar sinais de fraqueza. Afinal de contas, foi eliminado nas meias-finais de Monte-Carlo, Barcelona e Madrid por Fabio Fognini, Dominic Thiem e Stefanos Tsitsipas, respetivamente, algo que fez soar os alarmes… rapidamente desligados por aquela já lendária tirada do maiorquino numa conferência de imprensa em Roma. “O que aconteceu em Monte-Carlo aconteceu, o que aconteceu em Barcelona aconteceu, o que aconteceu em Madrid aconteceu. E agora estamos em Roma”. Pois foi.
E o que aconteceu a seguir foi ganhar o Internazionali BNL d’Italia, batendo Novak Djokovic na final, antes de somar mais um troféu de Roland Garros para a estante lá de casa. Ora, de certa maneira, estamos de regresso a esse cenário de 2019. Com a agravante de ter sofrido uma lesão no início da época, o que o fez chegar à terra batida apenas com o Australian Open nas pernas, Nadal não pareceu tão dominador como é habitual. A dúvida cresceu com a derrota frente a Andrey Rublev em Monte-Carlo e quase assumiu outros contornos em Barcelona, mas Tsitsipas não aguentou a final de 3h40. Só que acentuou-se novamente com o desaire claro aos pés de Alexander Zverev em Madrid. Lá voltava a tirada de Nadal.
Chegávamos, então, a Roma. Nadal esteve olhos nos olhos com a derrota diante de Denis Shapovalov, mas encontrou forma de sobreviver e talvez tenha desbloqueado a época de terra batida nesse encontro. Pode parecer exagerado, mas um trambolhão nos oitavos-de-final em Roma seria uma das bandeiras mais vermelhas que se poderiam mostrar ao touro de Manacor. A questão é que saiu desse buraco e acabou por derrotar Novak Djokovic na final. Então, vamos lá. O que aconteceu em Monte-Carlo, Madrid e Roma aconteceu. Agora estamos em Paris. E então?
Ninguém ousa dar o favoritismo em relação a Roland Garros a outro ser humano à face da Terra que não a Nadal. E a verdade é que, por muito que jogadores como Tsitsipas, Zverev ou Thiem vejam que o espanhol não parece tão imbatível e dominador, o caso muda de figura em Paris. Um pouco como muda quando se olha para Novak Djokovic na Austrália. Arrisco-me a dizer que Nadal podia chegar a Roland Garros sem uma única vitória na época que seria sempre o favorito e iria reunir, de qualquer das formas, um enorme respeito que resvala em medo dos adversários. É que ‘inventar’ uma forma de ganhar três sets ao maiorquino em Paris é obra. Se é possível cair? Obviamente. Se é provável? Pouco.
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É inevitável reconhecer que, um dia, o testemunho vai mudar de mãos, mas a resposta dada por Nadal em Roma teve um peso enorme e ainda significou mais por ter sido dada frente a Djokovic na final. O sérvio tem todos os motivos para sentir que esta pode ser uma das melhores oportunidades dos últimos para roubar o troféu a Nadal em Paris, algo que vai tornar o torneio ainda mais entusiasmante. Mas voltamos à história do ano passado, por exemplo. Parecia ser o ano perfeito para Djokovic e Nadal reafirmou o favoritismo.
Mais do que técnica, do que táticas ou até capacidade física, a barreira psicológica é gigantesca. Djokovic lidera a armada para derrubar Nadal, com Tsitsipas, Zverev e Thiem logo atrás a quererem entrar na ação também. Será que algum deles terá essa força mental para colocar dúvidas na mente do tenista espanhol? Jannik Sinner e Shapovalov colocaram essas dúvidas em Roma, mas Nadal soube apagá-las à base da força e da experiência. Resta saber se esse monstro psicológico com que Rafa joga do seu lado vai voltar a esmagar os sonhos e objetivos do resto do circuito. E desengane-se quem pensa que o talento puro dos miúdos pode chegar para sorrir. Ou é preciso lembrar que Djokovic deu uma lição a um Daniil Medvedev que parecia ter tudo reunido para ganhar na Austrália?
Acima de tudo, voltamos a uma premissa que tem assentado tão bem nos tempos que correm hoje em dia no mundo do ténis. Vamos sentar-nos e aproveitar. O que quer que aconteça será mais um pedaço de história e ver Djokovic a tentar roubar o trono a Nadal ou os mais novos a lutarem por alcançar um dos mais improváveis feitos na eternidade do ténis tem tudo para nos encher as medidas. O que aconteceu em Monte-Carlo, Madrid e Roma aconteceu. Agora estamos em Paris. E então?