Anna Kournikova, o ‘monstro do marketing que acabou por se comer a si próprio’
Deixou o circuito há precisamente 12 anos, sem nunca ter conquistado qualquer torneio de singulares, mas a verdade é que não há fã de ténis, ou até mesmo de desporto, que não se esqueça de imediato do seu desinteressante palmarés cada vez que ouve o nome de Anna Kournikova.
Numa altura em que Maria Sharapova estava longe de se transformar na maior e mais perfeita máquina de fazer dinheiro da história do desporto, a russa de sorriso fácil e trança a balouçar até meio das costas fez o que mais nenhuma tinha conseguido até então: ganhar milhões em patrocínios, conquistar simpatia para lá do ténis e tornar-se no atleta mais googlado do planeta sem recurso a triunfos de encher verdadeiramente o olho.
À CNN, Nick Bollettieri, antigo treinador de Kournikova e de alguns dos maiores nomes de sempre, como Andre Agassi e Monica Seles, diz que a responsável por tanto sucesso fora de linhas é só uma e estava bem à vista de todos: a beleza. “Quando são oferecidos três, quatro ou cinco milhões aos miúdos, os pais dizem ‘aceitamos’, especialmente se tiverem boa imagem, e Anna Kournikova tinha muitoooo boaaaa imagem”, relembrou o técnico de 84 anos.
Atributos físicos que a tornaram, desde cedo, no centro de todas as atenções. “Nos torneios maiores, se ela estava a treinar, e não havia nenhum grande nome a jogar no court principal, todos os homens iam vê-la. Ela dava espetáculo. Quando ela olhava para os homens, havia muitos dispostos a deixar as suas próprias mulheres”, acrescentou o proprietário da Nick Bollettieri Tennis Academy, sediada na Flórida, EUA.
Pioneira na arte de fazer dinheiro
Aos 15 anos, era já encarada como a última coca-cola do deserto pelas marcas que não se cansaram de abrir os cordões à bolsa para ter a jogadora de que todos falavam como sua embaixadora. Manobras milionárias que contribuíram para “distrair a adolescente de vencer o troféu que nunca chegou a erguer”, tendo-se “transformado no monstro do marketing que acabou por se comer a si próprio”, como defende David Skilling, consultor de marketing e relações públicas para atletas profissionais.
“Penso que a culpa não foi propriamente da Anna. Foi apenas a maneira como a imprensa pegou e tirou partido da situação. Os jogadores eram, muitas vezes, vistos como símbolos sexuais de uma forma que excedeu o que eles faziam [no court], mas, naquela época, penso que se intensificou “, acrescentou Skilling.
“O ténis feminino ganhou muitos contratos depois de ela aparecer. Há muitas coisas que a Anna fez pelo desporto que vão muito para lá dos resultados, de vitórias e derrotas”, acrescentou Bollettieri.
A inveja mora ao lado
E se a antiga número oito mundial e vencedora de dois títulos do Grand Slam em pares era um verdadeiro chamariz para as grandes marcas – como a Adidas, a Omega ou a Berlei, que a faziam embolsar cerca de 10 milhões de dólares todos os anos – a verdade é que Kournikova também não se livrava dos olhares de soslaio das suas colegas.
“Muitas das outras jogadoras tinham inveja dela, e com alguma razão. Recebia muito mais atenção e dinheiro dos patrocinadores que algumas tenistas que eram melhores do que ela”, relembra o jornalista do The New York Times Ben Rothenberg.
Faltou um bocadinho assim
Obrigada a abandonar a competição aos 22 anos (em 2003), por conta de sucessivas lesões, Kounikova viu não só a possibilidade de conquistar o tão desejado título individual cair por terra como a oportunidade de cimentar a sua reputação num desporto onde tudo parece ter brilhado mais do que o ténis que saiu da sua raquete.
“Talvez devesse ter jogado torneios mais pequenos”, frisou Rothenberg. “Mas ela não planeava os torneios apenas para tentar ganhar um título, ela jogava as grandes provas e defrontava as melhores das melhores”, acrescentou.
Já Bollettieri, não tem dúvida do que faria para ajudar a menina que lhe surgiu à frente quando tinha 10 anos e gritou empolgada “estou pronta para a aula” a vencer um torneio. E não um dos pequenos, porque, afinal, “Anna é o mais promissor talento que temos por aqui”, conforme chegou a afirmar.
“Os Andres, os Couriers, as Serenas, as Sharapovas – a maioria deles tem uma direita fulminante. Nós não conseguimos isso com a Anna. E a falta de uma arma, a ausência de uma pancada arrebatadora foi, provavelmente, a razão por que não venceu um Grand Slam”, concluiu.