Don Budge: o prodígio americano que reinventou a 'esquerda'

Don Budge: o prodígio americano que reinventou a ‘esquerda’

Por Tiago Ferraz - maio 25, 2020
Donald-Budge
American Donald Budge in action against Germany’s Baron Gottfried Von Cramm, unseen, in the Final of Wimbledon Men’s Singles Match, Wimbledon, London, July 2, 1937. Budge defeated Von Cramm 6-3, 6-4, 6-2. (AP Photo)

Nova semana, novas histórias. O Bola Amarela continua a relembrar todos aqueles que ajudaram o ténis a tornar-se na modalidade que tem cada vez mais expressão nos dias de hoje. Com efeito, fomos à procura da história de um dos melhores tenistas de todos os tempos: Don Budge.

John Donald Budge nasceu a 13 de junho de 1915, na Califórnia, Estados Unidos da América, e desde cedo se percebeu que o caminho do norte-americano só poderia passar pelo ténis: apesar do seu pai, Jack Budge, ter sido jogador de futebol do Glasgow Rangers (agora denominado de Rangers FC) o bichinho da bola amarela acabou por levar a melhor já depois de Don Budge ter experimentado outras modalidades e assim nascia um ‘prodígio’.

Don Budge dava nas vistas fisicamente e a nível de jogo: o norte-americano era alto, magro, ruivo e tinha um talento inacreditável para a prática da modalidade. Don Budge acabou por ser um dos tenistas que mais contribuiu para melhorar as pancadas do próprio jogo e começou o seu caminho triunfal na década de 30 quando, aos 23 anos, ‘desafiou’ a hegemonia de Fred Perry e conseguiu o impensável: tornou-se no tenista mais jovem de sempre a vencer os quatro torneios do Grand Slam no mesmo ano: Australian Open, Roland Garros, Wimbledon e o US Open (Perry fez feito idêntico, mas Budge foi o mais novo a conseguir isto: fê-lo aos 23 anos).

A nível desportivo, o norte-americano também deu muito que falar uma vez que conseguiu desafiar o domínio de Fred Perry e von Cramm numa época em que o ténis ainda estava longe de se profissionalizar: o ano de 1938 ficou ainda marcado por aquele que é visto por muitos como o melhor encontro de todos os tempos: estávamos na Taça Davis e o duelo era entre os Estados Unidos da América de Don Budge e a Alemanha de Gottfried von Cramm numa final muito polémica.

Don Budge, à semelhança de outros grandes históricos do ténis como René Lacoste, por exemplo, procurava sempre mais e tinha uma característica que o distinguia dos demais na época que acabou por revolucionar o ténis nesse período: era dono de uma esquerda com uma potência que deixava todos de ‘boca aberta’. Para se ter uma ideia do impacto que o norte-americano teve na nossa modalidade, devemos ter em conta que Don Budge conseguia imprimir efeito na sua pancada de esquerda, isto é, o top Spin o que era, verdadeiramente, invulgar na época. O sucesso desta pancada era tão vincada que o próprio Don Budge foi capa, em 1935, da Time Magazine na qual surge a executar uma das suas melhores pancadas: a esquerda.

O norte-americano vivia dias felizes e foi, sem surpresa, que chegaram os ‘anos de ouro’ de Don Budge que, entre 1937 e 1938, esteve 92 encontros consecutivos a vencer o que dá quase dois anos sem derrotas, de inícios de 1937 até ao final de 1938, anos em que esteve no topo do ténis mundial.

O norte-americano provou que era diferente dos demais e, nessa época, foi apelidado do “melhor tenista de todos os tempos” pelo seu colega de profissão Sydney Wood. Com o sucesso de Budge, rapidamente, começou a fazer-se comparações com outros grandes nomes da época que “deu” a conhecer uma das maiores rivalidades de sempre no mundo do ténis entre dois ‘campeões’: o norte-americano Don Budge e o britânico Fred Perry. Ainda assim, este período de sucesso começou quando Don Budge bateu von Cramm na final do torneio de Wimbledon de 1937 ficou ainda marcado por um feito sem precedentes: Don Budge tornou-se no único tenista que venceu o torneio de Wimbledon em todas as variantes: individual, pares e pares mistos tudo como tenista amador.

 

Imagem: AP (Final de Wimbledon 1937)

Durante estes dois anos, Don Budge venceu o US Open em 1937 e, no ano seguinte, como já vimos, repetiu estas conquistas às quais juntou ainda Roland Garros e o Australian Open para somar seis majors ao palmarés. Na variante de pares, Don Budge venceu também o US Open (em 1936 e 1938) e conquistou a variante de pares mistos, também do US Open, em dois anos consecutivos, 1937 e 1938.

O norte-americano esteve ainda ligado a um episódio de ‘solidariedade’ para com o seu colega e rival von Cramm quando este foi condenado a um ano de prisão depois da Gestapo, a polícia secreta do estado alemão, ter descoberto que von Cramm era homossexual e que tinha um amante judeu com o nome de Herbst. A sentença acabou por ser reduzida por ter sido provado que que o alemão foi alvo de chantagem por parte do seu amante, mas esse episódio teve consequências desportivas: von Cramm perdeu os apoios da Federação de Ténis Alemã e Fred Perry e Don Budge tentaram ‘amenizar’ o sucedido e ‘aliaram-se’ ao rival ao assinarem uma petição dirigida a Adolf Hitler para que o alemão fosse libertado.

Don Budge tornou-se profissional em 1939 e, ao longo da sua carreira, venceu 43 títulos, somou 569 encontros a vencer e sofreu ‘apenas’ 278 derrotas. O norte-americano fez parte da equipa dos Estados Unidos na Taça Davis entre 1937 e 1938. Em 1942, após o final da temporada nos Estados Unidos, Don Budge juntou-se ao exército e ajudou a força Aérea no combate à segunda Guerra mundial.

Em 1969, o norte-americano publicou uma auto biografia denominada de “Don Budge: a Tennis Memoir” onde conta a história da sua vida que ficou marcada por algumas lesões também.

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O livro de Don Budge

Don Budge acabou por falecer, aos 85 anos, no dia 26 de janeiro de 2000, mas o seu nome vai estar sempre ligado à modalidade que nos apaixona à semelhança do que fizeram outras grandes figuras como por exemplo René Lacoste e/ou Margaret Court.

Jornalista de formação, apaixonado por literatura, viagens e desporto sem resistir ao jogo e universo dos courts. Iniciou a sua carreira profissional na agência Lusa com uma profícua passagem pela A BolaTV, tendo finalmente alcançado a cadeira que o realiza e entusiasma como redator no Bola Amarela desde abril de 2019. Os sonhos começam quando se agarram as oportunidades.